10.7.11

2 # Carta para a tua paixão.

São duas da manhã e as palavras já não são muito coerentes. Não sei à quanto tempo devias habitar em mim, nem sei como permiti que te instalasses no meu sistema nervoso. Lembro bem de como era tudo quando chegaste aqui. A minha vida era melancólica, sem vida, repara bem na ironia. A mesma rotina de sempre, amores não correspondidos criaram um muro de pedras em redor do meu melhor órgão, e o mais quebrado. Inicialmente, recusei a tua entrada, mas lá fui cedendo passagem, com esperança de que nunca o irias ferir. Foste para o lugar mais remoto e sombrio meu, o que se localizava perto da arrecadação de mágoas e sentimentos feridos. A maioria não aguentaria esse local e iria-se embora com mais rapidez do que chegara e ainda mais euforia. Mas tu ficaste, por mais horroroso que fosse, ficaste. Era mais um recanto perdido o teu local de habitação não é verdade? Mas lá conseguiste colocar as tuas malas, limpaste todo o pó e arranjaste espaço para mais um monte de tralha acumulada. Quando o meu coração ficava pequenino, o teu espaço não parecia mais do que um canto mal arranjado em que as paredes quase se tocavam e mal conseguias respirar, mas de alguma forma lá conseguias empurrar-las e recomeçar tudo de novo sempre a aumentar o teu habitat. O tempo ia passando, contigo escondido, no fundo de tudo, sozinho. Ficaste aí mais de um ano, sem veres uma pequena luz, sem eu nunca falar contigo calmamente e com carinho. Eras quase como o meu "escravo", eu mal-tratava-te tanto mas apesar de tudo insistias ficar quando eu te escorraçava do teu local... Sempre soubeste que havia andares superiores mas contentavas-te com o que tinhas, o quanto admirava isso. Criaste um dia uma pequena janela com vista para o "campo de borboletas" onde ficavas a maior parte dos teus dias a ler todas as minhas recordações e sonhos futuros. Nessa altura, podemos dizer que já não te berrava tanto, sorria mais e permitia um ou dois "abusos"... Um dia de turbulência, nem sabes tu bem como, lá foste tu parar ao andar de cima, acordando sobressaltado por não veres os teus pertences. Na verdade, eu própria te arrastei a esse lugar em mim, queria-te dar mais espaço, tu necessitavas. Criaste com os teus dotes uma escadaria de ligação entre estes dois espaços, pintaste de novos tons o meu interior e gritaste ao meu cérebro que me amavas. Mas não foi este que te ouviu mas sim as borboletas do meu jardim. Tu, dentro de mim, enchias-me de fogo todas vezes que falava contigo, dizias que era forma de demonstrares o quanto eras vivo comigo e somente comigo. Sem me dar conta, já te tinhas instalado em metade do meu coração e eu, na verdade, nem me importava. Contigo era feliz, disso eu tinha a certeza e tu sabias-lo. Mas havia outra coisa que eu sabia, ou que soube com o tempo... Tu jamais erass o mesmo que eu conheci e recusei entrada. Tinhas-te tornado menos lutador. Tinhas espaço garantido e quando ele ficava pequenino e apertado, tu reclamavas... Até ao dia em que nem isso ouvi. Deixei de ouvir os teus passos em mim, deixei de ouvir a tua voz na minha cabeça. Soube assim que te tinhas ido embora, sem aviso ou despedida. Sem qualquer pedido de desculpas. Simplesmente foste como vieste e te instalaste. Deixaste assim metade de mim sem dono, sem razão, ao desconhecido. Espero que percebas que esse lugar continua a ser teu, nunca ninguém o irá habitar, moram lá os fantasmas das tuas recordações que eu nunca quero abandonar. Para mim, não está acabado, eu ainda te procuro por vezes no meu sangue ou na minha mente... Mas ao fazer isso descubro que foste e levaste coisas de mim. Podias ter levado o meu amor por ti, mas esse deixaste ficar, guardado num local que só tu tens acesso quando vens pois eu não te consigo negar passagem como antigamente, e acabo sempre sofrendo por ti, pequeno pedaço de carvão que se transformou em diamante.

2 comentários:

Twenty-seven disse...

Está lindo. (':

rv* disse...

"Podias ter levado o meu amor por ti, mas esse deixaste ficar, guardado num local que só tu tens acesso quando vens pois eu não te consigo negar passagem como antigamente, e acabo sempre sofrendo por ti, pequeno pedaço de carvão que se transformou em diamante." soooooooo trueeeeeeeeeee ! o: o:
oh , inês eu AMO-TE ! <3